Nosso CFO e presidente do Instituto Brasileiro dos Executivos de Finanças de Minas Gerais (Ibef-MG), Júlio Damião concedeu entrevista ao Jornal Diário do Comércio, na edição publicada no último dia 28 de outubro, para falar do panorama da economia brasileira na atualidade e o que podemos esperar para 2022.
Confira a entrevista na integra:
É fundamental para o planejamento das empresas uma correta leitura de cenários no Brasil e no mundo, com relação ao mercado global, qual a sua análise sobre o ano de 2022?
J.D: Acredito que mesmo não tendo como ator principal a pandemia, teremos um ano extremamente desafiador. Globalmente também teremos a preocupação com inflação; devido à Covid-19 muitas empresas se adequaram com uma estrutura menor devido à diminuição do consumo, agora, com a vacinação e o cenário de retomada das atividades da economia, temos uma oferta maior que a demanda, que vai impactar nos preços, já estamos observando um grande aumento no custo logístico, de alimentação e commodities, além da preocupação com a energia fruto de um crescimento não planejado pelas empresas como temos visto na questão do gás natural e carvão na China e Índia, portanto, teremos sim preocupação com a inflação em 2022.
Os Bancos Centrais ainda continuaram a injetar dinheiro na economia até que esta equação oferta x demanda esteja equilibrada. Hoje os juros no mundo estão negativos, o que incentiva o investimento, teremos na questão monetária e de juros de difícil equilíbrio, será um ano de ajustes. Importante acompanhar países e setores que possam mostrar enfraquecimento de investimentos, os países estão com déficit em suas contas e isto é muito preocupante.
O setor imobiliário da China está com problemas de liquidez, e não digo apenas da Evergrande, outras empresas do setor estão com problemas. Então, é importante olharmos para as oportunidades de crescimento e também para o risco de liquidez; quando se diz respeito aos EUA e China, nenhum impacto é local.
Quais são os maiores desafios para a economia brasileira em 2022?
J.D: Acredito que mesmo não tendo como ator principal a pandemia, teremos um ano extremamente desafiador. Globalmente também teremos a preocupação com inflação; devido à Covid-19 muitas empresas se adequaram com uma estrutura menor devido à diminuição do consumo, agora, com a vacinação e o cenário de retomada das atividades da economia, temos uma oferta maior que a demanda, que vai impactar nos preços, já estamos observando um grande aumento no custo logístico, de alimentação e commodities, além da preocupação com a energia fruto de um crescimento não planejado pelas empresas como temos visto na questão do gás natural e carvão na China e Índia, portanto, teremos sim preocupação com a inflação em 2022.
Primeiro, teremos as eleições presidenciais, que historicamente sempre trouxeram incertezas no crescimento do Brasil, e nos últimos anos temos observado uma maior polarização, neste cenário, as empresas não fazem muitos investimentos. Taxa de juros é um fator importante para a economia brasileira, taxa Selic, assim como a inflação estava em queda e agora estamos acompanhando uma alta preocupante.
O custo do dinheiro é importante para os investimentos, se tiver muito alto, o dinheiro destinado à construção de fábricas e outros negócios é alocado para o setor financeiro, pois os juros altos compensam o risco do negócio. Ao mesmo tempo, a taxa de juros é importante para manter a inflação, pois regula o poder de compras das famílias e diminui o consumo, desacelerando a economia.
No Brasil precisamos de um equilíbrio muito delicado. Hoje estamos enxergando um aumento da economia, mas ainda estamos com problemas de consumo e continuamos com alto desemprego, elevar a taxa de juros sem aumentar os investimentos pode agravar a questão econômica.
Outro fator fundamental no Brasil é a cotação do dólar. É certo que o dólar alto favorece as exportações, permitindo aumento na receita da balança comercial brasileira. Porém, temos que entender que o dólar em torno de R$ 5,59 (data de 25/10/21) não é atraente para a cadeia produtiva, pois as importações de máquinas e equipamentos entre outros itens tecnológicos ficam comprometidas, assim como a margem das empresas que precisam de produtos importados para a produção.
O Brasil possui ações de incentivo tecnológico, mas ainda somos muito dependentes do mercado internacional. O aumento do dólar também tira o poder de compra das famílias. É interessante porque muitas pessoas não percebem isso. Temos como maiores exemplos hoje o preço dos combustíveis e alimentos que, consequentemente, terão fortes reflexos na alta da inflação.
Nossa moeda foi uma das que mais se desvalorizou em todo o mundo. Basicamente todos os setores já voltaram às suas atividades para o nível pré-pandemia, a diferença é que a inflação em 2019 era de 4,31%, a cotação do dólar, que em 2019 era de R$4,03, hoje está em R$5,59, desta forma, mesmo com a economia voltando, as famílias estão mais empobrecidas e os empresários não investindo o necessário para um crescimento mais robusto do PIB em 2022.
E as reformas?
J.D: Acredito que mesmo não tendo como ator principal a pandemia, teremos um ano extremamente desafiador. Globalmente também teremos a preocupação com inflação; devido à Covid-19 muitas empresas se adequaram com uma estrutura menor devido à diminuição do consumo, agora, com a vacinação e o cenário de retomada das atividades da economia, temos uma oferta maior que a demanda, que vai impactar nos preços, já estamos observando um grande aumento no custo logístico, de alimentação e commodities, além da preocupação com a energia fruto de um crescimento não planejado pelas empresas como temos visto na questão do gás natural e carvão na China e Índia, portanto, teremos sim preocupação com a inflação em 2022.
O Brasil não pode mais esperar pelas reformas tributária e administrativa. Temos ainda grandes desafios estruturais pela frente, não podemos mais conviver com o sistema tributário atual. Pagamos em média 34% de impostos, um dos mais altos do mundo, além disso, não podemos mais conviver com um sistema tributário complexo. Interpretar, traduzir e executar as leis tributárias no Brasil é um grande desafio, além dos custos incorridos para este controle, pois as empresas gastam muita mais horas e pessoas para este fim, horas e pessoas que poderiam ser alocadas para gerar valor nas empresas.
Também não acredito que uma reforma tributária “fatiada” como temos observado com o Imposto de Renda possa funcionar: ou efetivamente fazemos um projeto único – e hoje existem vários projetos no Congresso, temos visto agora a PEC 110 com mais visibilidade com a criação do “IVA Dual” – ou não vamos efetivamente ser competitivos, e pior, estaremos aumentando o risco de uma economia com pouco crescimento.
A reforma administrativa também é fundamental, precisamos entender como o estado pode ser mais eficiente e menos burocrático para entregar à sociedade um serviço de qualidade e que realmente fomente os negócios.
A percepção é que o estado arrecada muito e entrega pouco, existem muito iniciativas positivas e muitas pessoas qualificadas no estado, precisamos de um processo em que estas iniciativas possam ser sentidas pela sociedade, precisamos repensar o modelo atual e fazer a transição de forma pacífica e coordenada com o Executivo, sociedade e Congresso Nacional. Esta é uma pauta estratégica para o País.
Tivemos um grande “estresse” no mercado com relação ao não cumprimento da regra do teto de gastos, porém a maior incerteza do mercado é não saber exatamente a política do governo com relação à real despesa deste ano e do próximo. Com certeza teremos uma despesa acima do esperado, o mais importante é o governo esclarecer o tamanho da despesa e receita correspondente.
Esta é a diferença entre uma análise de risco correta e especulativa: quanto mais especulação, mais o ambiente será turbulento. Os desafios são enormes, como são enormes também as oportunidades.
O Brasil tem 213 milhões de habitantes, um clima favorável à agricultura e a fontes de energias renováveis, um sistema bancário conciso e em crescimento, assim como uma estrutura de crédito que pode alavancar o consumo e a economia, um dos maiores celeiros de startups de tecnologia e um dos maiores sistemas de saúde do mundo, assim como uma área de commodities consolidada. Se fizermos os ajustes necessários das reformas estruturais e econômicas, o Brasil vai responder positivamente, porém não enxergo para 2022 grandes mudanças devido ao ano eleitoral.
Este momento econômico exige das empresas brasileiras um orçamento muito equilibrado, priorizando o caixa e as margens. A pandemia está diminuindo o seu ritmo, mas os impactos provocados por ela na economia brasileira e global serão sentidos com mais intensidade no próximo ano.
Qual a importância e o papel da área financeira na retomada da economia no pós-pandemia?
J.D: A área financeira ganhou muita relevância durante a pandemia e será de extrema importância na retomada econômica pós-pandemia. Os CFOs e toda a estrutura financeira participaram diretamente junto ao CEOs e Conselhos de Administração das empresas na coordenação estratégica durante a crise e continuam na linha de frente nesse momento de retomada.
Alguns pontos são fundamentais nesse momento, como preservar a liquidez das empresas, priorizando os investimentos com maior retorno de caixa no curto prazo. Importante destacar as negociações pontuais com fornecedores para alongar prazos de pagamento, diminuindo a necessidade de caixa (NCG) e principalmente estar pouco alavancado financeiramente, para buscar aumentar o lucro líquido, mantendo a margem operacional.
Esta é uma equação extremamente melindrosa, pois a maioria das empresas quer aumentar o faturamento a qualquer custo sem pensar nas margens e acabam vendendo com prejuízo. Existem muitos outros índices analisados pelo mercado como Ebitda, EVA, ROI, porém, a liquidez faz toda a diferença, principalmente na crise da Covid-19. (O Caixa é Rei). Em períodos de crise, soma-se a parte emocional, pois o estresse aumenta muito, pois não temos uma real dimensão dos impactos econômicos nos negócios.
O desenvolvimento do “Soft Skills” se tornou fundamental para a área financeira. Comunicar corretamente os números e as ações, entender da estratégia do negócio, ter análise crítica, saber resolver problemas complexos, estar atento à transformação digital das ferramentas financeiras e dos meios de pagamento, ser um líder e principalmente ter calma para não se contaminar com informações “incorretas” ou de “momento” são fundamentais.
As empresas ficaram mais horizontais, o que se busca hoje são decisões com rapidez, mas principalmente com qualidade, a execução correta é a maior vantagem competitiva das empresas hoje. Por isso, os executivos financeiros foram e são fundamentais nesse momento para tornar o negócio competitivo.
Você assumiu o Ibef-MG no início do ano. Como tem sido administrar a instituição durante o período de crise pela pandemia da Covid-19?
J.D: Entrei no Ibef como diretor e, na primeira reunião, fiquei impressionado com a qualidade das pessoas e com o nível de discussão sobre os mais variados assuntos, principalmente sobre finanças e economia.
Fiquei muito honrado com o convite para presidir o Ibef (2021-2023), é uma responsabilidade muito grande, pois representamos metade do PIB de Minas. Participam da instituição os maiores nomes em finanças de Minas Gerais e também muitos CEOs de empresas são associados, além das mais variadas empresas como escritório de advocacia e seguros.
O DNA do Ibef é na área financeira, mas hoje posso afirmar que é um lugar de encontro de grandes lideranças que pensam Minas e o Brasil. A instituição tem tido um crescimento expressivo nos últimos anos, fruto da importância da estratégia financeira das empresas e das divulgações de opiniões de vários diretores nas mídias, aumentando ainda mais a credibilidade do Ibef. Tenho muito orgulho de fazer parte desta comunidade.